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O tema da migração: Um desafio nas Relações Internacionais

Texto de coautoria com Leticia Jacqueline Ako da Guia Nyamien e Ana Beatriz Sitjar

13/05/2023 09h17 Atualizada há 1 ano
Por: Elane Dornelles
Foto: Rafael Zart/ACNUR
Foto: Rafael Zart/ACNUR

Nesta segunda semana de maio de 2023, várias notícias sobre o assunto de migração têm sido vinculadas e propagadas nos principais canais de notícias internacionais. Uma delas foi a fala do subsecretário do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, pe. Fabio Baggio, responsável pela Seção de Migrantes e Refugiados e pelos Projetos Especiais pelo vaticano, onde ele fala que a migração é “um direito ainda não codificado em nível internacional: o direito de não ter que emigrar, de poder permanecer na própria terra”[1]. 

Outra notícia importante nesta semana foi a mudança da política de asilo dos Estados Unidos que entra em vigor a partir desta sexta-feira (12/05). A partir do dia 12 vai entrar em vigor a política Title 8, que permitirá expulsar quem entrar de maneira ilegal nos EUA, com a proibição de reingressar no país por cinco anos e consequências penais caso tentem.[2]Com as eleições estadunidenses marcadas para daqui há 18 meses, o Presidente Joe Biden tenta evitar um aumento do fluxo migratório como uma estratégia política diante da pressão da oposição republicana no congresso. 

Outro fato importante da semana, referente ao tema da migração foi a notícia no dia 07 de maio, último domingo, que um avião providenciado pela Venezuela pousou no Aeroporto Internacional Simón Bolívar, que atende Caracas, trazendo 115 cidadãos que desejavam regressar após migrarem por conta da crise econômica. Estes migrantes venezuelanos puderam retornar ao seu país de origem após passarem duas semanas retidos na fronteira entre o Chile e o Peru por proibições impostas pelos governos de Santiago e Lima[3]. 

Estas três citações do panorama migratórios dos países supracitados, é apenas uma fatia do bolo que a migração tem requerido, sob o ponto de vista social, político e econômico por parte dos Estados, nas ultimas décadas e que com a pandemia, o que já era ruim se agravou ainda mais com relação aos problemas vinculados aos processos migratórios entre os países. 

De acordo com o Glossário da Migração escrito e organizado pela Organização Internacional para as Migrações, a palavra migração significa “o processo de atravessamento de uma fronteira internacional ou de um Estado. É um movimento populacional que compreende qualquer deslocação de pessoas, independentemente da extensão, da composição ou das causas; inclui a migração de refugiados, pessoas deslocadas, pessoas desenraizadas e migrantes económicos”[4].

A migração internacional é um fenômeno heterogêneo, que envolve diferentes tipos de imigrantes e emigrantes, podendo ser desencadeada por vários motivos: desastres ambientais, guerras, perseguições políticas, étnicas ou culturais, causas relacionadas a estudos em busca de trabalho e melhores condições de vida, entre outros. As migrações internacionais, atualmente, constituem como um espelho das assimetrias das relações socioeconômicas vigentes a nível global, sendo um dos temas principais das Relações Internacionais.

Conforme uma pesquisa realizada em uma disciplina de política comparada (matéria obrigatória para o curso de Ciências Políticas da Universidade Federal da Integração Latino Americana- UNILA), utilizando o site do latinobarometro - que é uma ONG sem fins lucrativos com sede em Santiago do Chile, que utiliza um estudo de opinião pública que aplica anualmente cerca de 20.000 entrevistas em 18 países latino-americanos que representam mais de 600 milhões de habitantes[5] - e que serviu de base para entender o tema da migração de acordo com a opinião pública.

Para esse estudo comparado, partimos de uma proposta cujo objetivo é analisar as divergências e ou convergências do pensamento popular em relação às políticas de imigração dos países selecionados (Brasil, Colômbia e Bolívia) no ano de 2020. Dessa forma, nosso critério de recorte geográfico para a escolha destes três países foi o da escolha por países com o maior número de fronteiras ao longo de seu território, na América Latina. Através das perguntas selecionadas, analisamos a comparação do pensamento popular em relação a perda e ganhos da vinda dos imigrantes e se existem questões xenofóbicas que influenciam a opinião popular. 

Uma das perguntas é a opinião das pessoas quanto a receber imigrantes de países latino-americanos para viverem em seus países (Brasil, Colômbia e Bolívia), se acha muito positivo, um pouco positivo, um pouco negativo ou muito negativo receber imigrantes da América Latina, conforme a tabela abaixo:

Como resquício colonial, por muito tempo se perpetuou a associação de receptividade à imigrantes de países Europeus enquanto havia uma aversão à chegada de outras etnias não brancas ou vindas de países não centrais, como é o caso do Brasil.

Surpreendentemente, a pergunta do Latinobarômetro escolhida obteve resultados semelhantes aos da pergunta que se refere a receber imigrantes de fora da América Latina, mostrando que no ano de 2020 havia uma divisão popular bem acirrada sobre receber os imigrantes latino-americanos ser algo positivo ou negativo. Os números surpreendem por registrarem que já não é um parâmetro tão forte, o estabelecido pela dominância do eurocentrismo e toda a construção de observar europeus como “boas opções” de imigrantes.

Entretanto, os números negativos ainda são altamente preocupantes e a xenofobia está diretamente ligada aos números acumulados pelas respostas “algo negativo” e “muy negativo”, que somados são mais de 50%, significando uma grande parcela de certa intolerância direcionada à imigrantes. A violência da xenofobia vai desde a discriminação pela cultura, origem, língua falada.

Ainda assim, podemos verificar no gráfico que no Brasil mais de 50% dos entrevistados consideram ser positivo o imigrante latino americano. Em um panorama geral da pandemia, sob o ponto de vista comercial, grande parte dos consumidores estrangeiros passaram a ser desta região, devido a proximidade geográfica e facilidade de acesso deste público, podendo explicar em parte esta aceitação. Na Bolívia e Colômbia o gráfico mais preponderante é o negativo, podendo ser relacionado a proximidade com a Venezuela e a crise migratória deste país, que reverberou e se acentuou com os problemas sociais decorrentes da crise econômica durante a pandemia.

Esta foi apenas uma das varias perguntas em que o site mostra a opinião popular sobre assuntos sociais e políticos relevantes no contexto latino americano. De qualquer forma, o tema da migração ainda está longe de ser resolvido e é um assunto extremamente relevante para todos nós, migrantes ou não, e que deve ser encarado com seriedade e atenção por todos nós, pois se você vive em contato em sociedade este tema vai bater em algum momento a sua porta.

Reprodução/Conectas



[1] https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2023-05/coletiva-imprensa-dia-migrante-rifugiado-papa-francisco.html

[2] https://www.bbc.com/portuguese/articles/clellzwjjd6o

[3] https://www.brasildefato.com.br/2023/05/10/apos-sofrerem-repressao-no-chile-e-proibicao-no-peru-migrantes-retornam-a-venezuela

[4] SUIÇA. OIM ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL PARA AS MIGRAÇÕES. Glossário sobre Migração. Genebra: Organização Internacional Para As Migrações, 2009. 92 p. Disponível em: https://publications.iom.int/system/files/pdf/iml22.pdf. Acesso em: 11 maio 2023.

[5] https://www.latinobarometro.org/lat.jsp

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    Giro Internacional - por Elane Dornelles Ricarte
    Sobre Giro Internacional - por Elane Dornelles Ricarte
    Elane Dornelles Ricarte é Enfermeira especialista em Vigilância Sanitária e Saúde da Família, graduada em Relações Internacionais e Integração pela UNILA onde faz parte dos Observatórios do BRICS desde 2019 e de Gênero desde 2022 pela mesma Universidade. É voluntária no Instituto Idéia Ambiental atuando na gestão de projetos que envolvem o Meio Ambiente e a Saúde na região do tríplice fronteira do Paraná e atualmente mestranda em Estudos Comparados sobre as Américas na UNB.