O Brasil é o terceiro país com o maior número de animais de estimação no mundo: cerca de 150 milhões, de acordo com levantamento do Instituto Pet Brasil. Com espaço cada vez maior na casa e no coração dos brasileiros, os pets passaram a ser “humanizados” para viver como membros da família.
O problema, alerta a médica veterinária Ana Elisa Arruda Rocha, é que o fenômeno - confundido por muitos como amor e cuidado - está adoecendo os pets. “A humanização impede que os animais vivam de acordo com sua espécie e dificulta a adaptação e a interação com seus semelhantes. Animais têm necessidades e particularidades. Não respeitar as diferenças pode adoecer esses indivíduos.”
O primeiro sinal de que algo não vai bem são os distúrbios emocionais e comportamentais relacionados à depressão, agressividade, ansiedade, carência e medo. “Em decorrência desses quadros observamos compulsão alimentar, obesidade, alergias, automutilação, vômito, diarreia, problemas respiratórios, urinários, crises epiléticas e até o desenvolvimento de doenças crônicas”, diz a professora do curso de Medicina Veterinária do UniCuritiba – instituição que faz parte da nima Educação, o maior ecossistema de ensino superior privado do país.
Para não colocar os pets em risco, os tutores precisam entender que tratar bem e amar os animais significa oferecer todos os cuidados básicos necessários para o bem-estar, como alimentação adequada, água fresca, abrigo, carinho e acompanhamento veterinário de rotina.
“Precisamos saber o que é essencial para cada espécie. Para um cão, por exemplo, é importante caminhar, farejar, correr, brincar, roer, cavar e latir todos os dias. Para um gato, ter um local para dormir e se esconder de maneira segura, arranhar, escalar, ter um lugar apropriado para enterrar seus dejetos, ter acesso a alimentos úmidos e específicos para a espécie”, ensina Ana Elisa.
Consultório lotado
A humanização tem levado um número cada vez maior de pets aos consultórios veterinários.
A professora do curso de Medicina Veterinária do UniCuritiba lembra que os animais não precisam de roupas, sapatos, perfumes, camas luxuosas ou brinquedos caros. Banhos muito frequentes também são prejudiciais, principalmente se realizados com produtos e manejo inadequados.
Os tutores devem equilibrar suas vontades com a saúde física e emocional dos pets. “Existem relatos de pessoas que tatuaram seus animais de estimação e até saltaram de paraquedas com eles. Algumas dessas práticas, além de serem inadequadas, caracterizam maus tratos e são passíveis de denúncias”, informa.
Como as necessidades de cuidado variam de acordo com cada espécie, as recomendações de manejo e saúde são individuais e devem ser personalizadas pelo médico veterinário.
“Nos cuidados com cães e gatos, devemos evitar o uso de acessórios que possam incomodá-los, dar alimentos ou medicamentos sem orientação prévia, tratá-los como bebês, privá-los do contato com animais da mesma espécie ou de expressar seus comportamentos naturais”, orienta a médica veterinária.
Quando o problema começou?
A humanização começou quando os animais saíram das ruas e dos quintais e passaram a viver dentro das casas, de forma muito mais próxima das famílias. Esse movimento se intensificou nas últimas décadas.
“De maneira consciente ou inconsciente, os animais estão sendo direcionados para lugares que não são deles, para suprir a ausência de alguém ou a falta de algo”, analisa a especialista.
Essas condutas e a distorção de papéis não são benéficas aos pets, pelo contrário. Ana Elisa reforça que é necessário ter consciência do lugar que cada membro ocupa e da importância do bem-estar de todos os integrantes em famílias multiespécies.
“Os animais de estimação estão ao nosso lado nos fazendo companhia, nos protegendo e até realizando tarefas, como fazem os cães guia. Eles podem e devem fazer parte das famílias, desde que tenham seu próprio espaço e sejam amados e aceitos exatamente por quem são”, finaliza a médica veterinária.