No mês de maio, em que é comemorado nacionalmente o Dia das Mães, pensar sobre maternidade e mercado de trabalho não se torna um tema exclusivo do mês comemorativo, mas deve estar presente também nos outros e no dia a dia das organizações como uma das maneiras para se debater mais sobre o assunto e criar ações eficientes e justas para apoiar as mulheres mães nos mais diversos contextos e transformar a realidade profissional dessas mulheres ainda marcada por desigualdade e preconceito. E pensar em maternidade é também refletir sobre as suas várias configurações, como as mães solo, e as dificuldades e os desafios da jornada de trabalho e a criação dos filhos.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Brasil, são mais de 11 milhões de mães solo, mulheres que assumem a maior ou total responsabilidade emocional e financeira de seus filhos. E como pontua a pesquisadora, Janaína Feijó, no blog do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE), o termo solo não se refere apenas a ausência de um cônjuge, é muito maior que isso, todas as responsabilidades da vida social recaem em uma única pessoa, a mãe, que se desdobra, para cuidar, educar, criar seus filhos, muitas vezes sem uma rede de apoio, além da sua jornada dupla e tripla de trabalho, entre emprego e o trabalho doméstico. As profissionais mães ainda encontram muitas dificuldades no mercado de trabalho e, no contexto da mãe solo, essa realidade se torna ainda mais complexa.
Nesta trajetória, a relação das mulheres mães solo no mercado de trabalho é um desafio diário, e Luciane Munhoz conta que os desafios são grandes quando o assunto é maternidade e vida profissional. Luciane tem alma de artesã, se dedica ao artesanato desde sempre, há 42 anos, e junto ao trabalho artesanal, a gestão e a docência fazem parte da sua rotina. Ela trabalha como administradora há 30 anos e professora universitária há 26 anos, “é um dia a dia agitado, mas eu amo trabalhar e amo o que faço, o meu trabalho constrói quem eu sou, o sonho de trabalhar e o sonho de maternar devem ser complementares, um não pode jogar o outro para escanteio e a sociedade não pode exigir isso da mulher”, pontua Luciane.
O equilíbrio entre ser mãe e ter uma carreira profissional é uma demanda exaustiva, e essa realidade se realça ainda mais sendo mãe solo, que, na maioria das vezes, não tem uma rede de apoio para que as mulheres mães consigam atuar em suas profissões com dignidade, respeito e seus direitos resguardados. Luciane conta que sempre foi muito difícil, mas, no início, por não ter apoio familiar, a sua jornada de trabalho remunerada e não remunerada a colocava numa situação de sobrecarga física e emocional “nunca tive rede de apoio, minha mãe faleceu antes de eu ser mãe. Em um período, minha sogra me ajudou, mas sempre tive comigo que fazemos os filhos para criarmos e não os avós. Perdi a conta das vezes que me virei sozinha para levar o João com febre para o hospital à noite, e estar no trabalho no outro dia de forma produtiva”, afirma Luciane.
A maternidade solo é um cenário com muitos obstáculos, não só dentro das organizações, mas também na sociedade. Ainda há muito preconceito e os desafios do cuidado geram uma grande carga de responsabilidade nas mães solo, que, de acordo, com os dados do blog FGV IBRE, mais de 70% das mães solo no Brasil vivem em domicílios monoparentais, ou seja, um lar composto só por elas e seus filhos. E em 10 anos, entre 2012 e 2022, a pesquisadora Janaína Feijó demonstra em números o crescimento de quase 20% de mães solo no Brasil. Luciane explica que conciliar os horários de sua rotina de trabalho com a do João sempre foi um desafio, porque além dos afazeres domésticos, da jornada de trabalho remunerada, tinha os horários das consultas, das reuniões da escola, e outras atividades “ter uma liderança humana na empresa, que acolhesse a minha realidade, sempre fez diferença. O fato de não ter uma rede de apoio, que pudesse ajudar nas responsabilidades familiares e contribuir para o equilíbrio da vida, é um fator presente na minha vida, como na de muitas mulheres”, pontua Luciane.
As organizações podem fazer muito para mudar esse cenário ainda desigual, por exemplo, adotando políticas que atendem esse contexto, como a flexibilidade de horário. Luciane conta que a relação entre empresa e maternidade é mais tranquila para ela atualmente “meu filho João está grande, tem 18 anos, e agora posso trabalhar com mais calma. Outro fator que muda é a modalidade de contratação, hoje sou PJ e, por isso, temos mais liberdade de horários e consigo acompanhar melhor meu filho e a sua rotina”, explica Luciane.
De acordo com o estudo Licença Parental nas Mellhores Empresas para Trabalhar da consultoria Great Place to Work, 47% das pessoas analisadas já abriram mão de oportunidades de trabalho por enfrentarem barreiras para conciliar as demandas da casa e do novo emprego. Luciane viveu algo parecido “em algumas empresas vejo que oferecem espaços aberto para ouvir e oferecer oportunidades de crescimento para as mães, mas depende muito da cultura da empresa, do gestor e da relação trabalhista estabelecida. A relação entre eu ser mãe e a minha profissão é uma relação de muitos ajustes e muitas vezes tive que abrir mão de crescer na profissão para poder criar o meu filho”, pontua Luciane.
A relação entre a maternidade solo e o mercado de trabalho pode se tornar melhor, e ter uma rede de apoio é imprescindível para que as mães não precisem escolher entre a maternidade e careira profissional, elas podem sonhar ser mãe e ter crescimento profissional ao mesmo tempo “o conselho que dou para as mães, especialmente mães solo, é ter resiliência e fé para conquistar o que sonham. Tudo passa, os filhos crescem e a dependência deles também diminui. Essa dica é preciosa: crie os filhos para serem independentes desde cedo: desde se alimentar até lavar uma louça, desde a lição da escola até o banho. Meu filho hoje com 18 anos se vira com quase tudo. E tenho muito orgulho disso”, pontua Luciane.