Durante muitos anos, o SBT nunca escondeu que a vice-liderança era suficiente. O mote até virou campanha publicitária, conferindo à emissora de Silvio Santos o título de vice-líder absoluto de audiência. Mas, no início do século XXI, as coisas mudaram um pouco.
Quem aí se lembra de algumas chamadas misteriosas que começaram a rondar a programação da tv do homem do baú? Uma fechadura misteriosa, em tons de vermelho e preto e a voz-padrão do SBT anunciava uma tal "casa dos artistas". Ninguém sequer fazia ideia do que podia ser aquilo. Quem usava ICQ, MirC ou mesmo o chat do UOL começava a pulverizar a internet com interrogações a respeito - claro, a 56 kbps que era o máximo possível na época.
O dia escolhido para a estreia foi o domingo à noite, quando Silvio Santos adentrou ao palco ao som da trilha que depois ficou famosa e fazendo a pergunta: "vocês já espiaram pelo buraco da fechadura?" Em um tom descontraído e sempre na companhia do auditório mais "feminino do Brasil", o animador Silvio Santos foi pouco a pouco revelando que a "Casa dos Artistas" se tratava de um reallity show e que confinaria em uma casa um intrépido grupo de artistas, tendo sua vida monitorada por câmeras 24h por dia.
Claro, hoje a fórmula é bem conhecida e mesmo quem não acompanha muito TV aberta é capaz de explicar do que se trata. Mas em 2001, a "Casa dos Artistas" foi a primeira experiência no gênero a ser realizada por uma tv aberta brasileira. O grupo de confinados da primeira "casa" foi:
O confinamento aconteceu em uma casa no bairro do Morumbi - colada à mansão de Silvio Santos. Algumas matérias da época mencionavam que o animador costumava visitar os bastidores inesperadamente para espiar "pelo buraco da fechadura" o desenvolvimento da trama. Tudo era gravado e a edição do programa era exibida à noite, exceto quando a liminar batia à porta da mansão mais vigiada do Brasil.
A atração - que liderou a audiência desde sua estreia - foi questionada pela TV Globo que já era parceira da Endemol, empresa produtora de formatos e inclusive proprietária do formato Big Brother. A briga foi complicada e o SBT precisou suspender a transmissão da Casa dos Artistas em uma das noites, precisando exibir um aviso de tela para os espectadores. Mais elementos para Silvio Santos "causar" e provocar a audiência e gerar burburinho entre as pessoas.
Em plena Casa dos Artistas era assim que os programas da época definiam os comentários acerca do programa. A coisa mexeu de tal maneira com o público que começou uma verdadeira torcida para que Bárbara Paz e Supla - o par romântico da edição - terminassem juntos em grande estilo. Enquanto isso, Alexandre Frota era o líder dos revoltados (ele saiu do programa e voltou, por ordem de Silvio Santos). Leandro Lehart (vocalista do Art Popular) desistiu da competição entre outros participantes que tentavam ao seu modo ganhar a simpatia do público durante seu confinamento.
Uma atmosfera de certa ingenuidade, misturada com doses homeopáticas de imaginação sem ofender nenhuma faixa etária: assim, "Casa dos Artistas" encerrou sua primeira edição conferindo à Bárbara Paz o primeiro prêmio, na época, de R$ 300 mil. Mais do que dinheiro, Bárbara conquistou o coração do patrão: estrelou logo em seguida duas novelas na emissora, além de cativar uma legião de fãs por todo país. Em uma época onde reallity show ainda era uma novidade, "Casa dos Artistas" soube aproveitar a crista da onda e surfar em mares ainda desconhecidos, tirando máximo proveito de uma realidade até então pouco explorada. Sem o gesso das produções globais, temperada com a simplicidade e popularidade da comunicação típica do SBT da época, a "Casa" foi um histórico momento que habita o mais profundo do imaginário do espectador da velha televisão, aquele que prefere o cantinho mais afetivo da memória de vida de milhares de pessoas.